08/03/2010

Porque estamos tão atrasados em Inovação Tecnológica?


Inovação tende a ser cada vez mais um item fundamental para medir o atual estágio de cada país ou região e especialmente útil para apontar possibilidades futuras e potenciais efetivos de desenvolvimento.
Em geral inovação e inovação tecnológica em particular implicam em agregação de qualidade e são requisitos essenciais para uma economia competitiva, próspera e sustentável, com melhores empregos e salários, e menor dependência de produtos e componentes importados e menos royalties pagos ao exterior.

Inovação é um conceito correlacionado com Pesquisa e Desenvolvimento empresarial, porém distinto e mais amplo. Inovação implica em tecnologia, máquinas e equipamentos, mas vai além, contemplando também pequenas mudanças incrementais, novas funcionalidades, bem como melhorias na gestão ou novos modelos de negócios, associados à conquista ou criação de novos mercados. Em um processo quase darwiniano, inovação em sentido amplo vem selecionando as empresas mais aptas. Especialmente para aquelas empresas com pretensões de mercados globais, a competição impõe inovação, em algum nível, como condição imprescindível.

Perceber a complexidade da inovação não resolve o problema, mas não ter essa sensibilidade prejudica muito a definição de políticas eficientes e eficazes para o setor. Assim, um ambiente inovativo nas empresas é favorecido pela existência no país de ciência avançada e pela capacidade regional de formar recursos humanos de ponta, mesmo que estas últimas atividades tenham seus centros de atividades na academia. Favorecer inovação não significa que seja suficiente ter boa ciência e formação de recursos humanos. O estímulo às atividades de risco (inovação também é risco) faz parte do jogo que conecta a inovação com a oferta ao mercado de produtos, processos e novas funcionalidades. Viabilizar bons ambientes de negócios demanda, adicionalmente, um conjunto não simples de externalidades positivas.

O que parece claro é que há poucos atalhos para, sem produção de conhecimento, conseguir estimular inovação nas empresas. Não é impossível ocorrer inovação nas empresas sem produção de conhecimento no país e recursos humanos de ponta na região, mas é evento tão raro que quase fortuito. Portanto, para propiciar inovação é importante que esses dois elementos estejam presentes simultaneamente: cooperação entre empresas e a academia bem como estímulo e suporte ao risco privado.Recentemente foi publicado um Relatório 2009-2010 sobre a Inovação para o Desenvolvimento (
http://www.innovationfordevelopmentreport.org/

). Trata-se de um estudo coordenado pela "European Business School", uma instituição privada de ensino sediada na Alemanha.

Neste relatorio, a liderança mundial em capacidade de inovação entre os 131 países analisados está com a Suécia, com 82,8 pontos. Em seguida vem a Finlândia (77,8 pontos), Estados Unidos (77,5 pontos), Suíça (77,0 pontos) e Holanda (76,6 pontos). Até aí, nada de surpresas. Na América Latina, o Chile lidera com 59,4 pontos, seguido do Uruguai (posição 49a com 52,8 pontos), Costa Rica (58a, com 51,5 pontos), Peru (60a, com 50,6 pontos), México (61a, com 50,5 pontos), Colômbia (72a, com 48,0 pontos) e, finamente, próximo ao final da lista, o Brasil (87a, com 45,2 pontos).

Observar que, segundo esse ranking, o Chile seria líder em capacidade de inovação na América Latina, ocupando a 29a colocação entre os países avaliados, ficando imediatamente acima da Itália e abaixo da Espanha.
Segundo os organizadores daquele estudo, o ranking reflete o desempenho dos países no denominado "Índice de Capacidade de Inovação" (ICI), com base em cinco critérios: (1) Ambiente Institucional; (2) Capital Humano, Treinamento e Inclusão Social; (3) Arcabouço Regulatório e Legal; (4) Pesquisa e Desenvolvimento; e (5) Adoção e Uso de Tecnologias de Informação e Comunicação. Esses critérios se distribuem por 61variáveis.

O relatório ressalta que o Chile, comparativamente aos demais países da América Latina, apresenta melhor desempenho em questões como eficiência do Governo, império da lei, ausência de corrupção, balanço fiscal, número de escolas públicas conectadas à internet, facilidade para realizar pagamento de impostos, taxas de penetração de internet banda larga e confiabilidade na geração de eletricidade.

Ainda segundo os organizadores do relatorio, o Chile seria um "caso interessante", pois "provaria que políticas sólidas e boas Instituições não são o resultado, mas os motores da criação de riqueza e prosperidade". O sólido gerenciamento macroeconômico - incluindo uma das políticas fiscais mais virtuosas do mundo -, aliado às reformas institucionais e à abertura da economia para as vantagens do livre comércio, do investimento externo e da competição estrangeira, teria criado uma "confiável engrenagem de alto crescimento econômico e de redução da pobreza". As autoridades chilenas também teriam implementado "micro-políticas com o objetivo de aumentar a eficiência dos serviços públicos por meio de diversas plataformas eletrônicas, e facilitar o uso de TICs de maneira geral".

Acrescenta ainda que o desempenho do Chile em matéria de inovação é o resultado da construção gradual de ambiente institucional de apoio ao desenvolvimento do setor privado e da introdução de uma série de políticas voltadas para aumentar o uso da tecnologia e promover o incremento da produtividade. A isso se somaria o compromisso do governo com o "e-government", com vistas a aumentar a qualidade dos serviços entregues à sociedade pelo setor público. O relatório conclui dizendo que o Chile "está bem posicionado para alcançar os países mais ricos da União Européia".

Reconhecidamente o Chile tem diferenciais positivos em relação ao Brasil, especialmente em educação, seja no nível básico (menos analfabetismo e mais anos de escolaridade) ou no acesso à educação superior (quase 52% dos jovens entre 18 a 24 anos contra menos de 14% no Brasil). Ocorre entretanto que hoje o Brasil é o 13º maior produtor de ciência em periódicos respeitáveis. Se publicações no exterior podem ser vistas como exportação de conhecimento, exportamos mais ciência (2% do total mundial de publicações) do que mercadorias (pouco mais de 1% do comércio internacional).
Nossa pós-graduação, que forma em torno de 11 mil doutores e 35 mil mestres por ano, só é comparável em números ao restante da América Latina somada. Além disso, aplicamos mais de 1,3% do PIB em ciência e tecnologia, o dobro percentualmente do Chile (em torno de 0,7%) do PIB.

Somos um dos três únicos países a extrair do próprio subsolo e refinar urânio. A meteorologia está pronta para enfrentar os desafios do aquecimento global. Não há nenhuma empresa de petróleo no mundo com o mesmo domínio tecnológico da Petrobras. É respeitada a nossa aeronáutica. Somos os primeiros em alguns setores do agronegócio (por exemplo, no etanol). Quase todos os grandes produtos de exportação têm ampla dose de tecnologia tupiniquim.Porque com tantos pontos positivos estamos ainda tão atrasados em inovação tecnológica?

As políticas para criar tecnologia brasileira sugerem a existência de vida inteligente nas agências de fomento. Em contraste, as regras para implementar tais políticas permanecem na Idade das Trevas.


Nossos formuladores revelam argúcia. Há ideias inteligentes e um mínimo de continuidade na sua implementação. Nota-se também um saudável aprendizado, ao entender os equívocos e procurar corrigi-los. A Lei da Inovação criou engenhosas pontes entre universidades e empresas, tornando possível oferecer subsídios monetários aos empresários inovadores. Ademais, o governo agora pode virar parceiro, entrando com capital de risco. Mais grave é o terrorismo dos sistemas de controle. São necessários, é certo. Contudo, Advocacia-Geral da União, Ministério Público, Receita Federal e tribunais de contas fazem coro para encontrar minudências técnicas que atrasam ou impedem o fluxo de pedidos de grande interesse para a nação. Em vez de entenderem e apoiarem quem merece, esses órgãos garimpam tecnicalidades impeditivas e presumem a desonestidade dos postulantes. Segundo advogados empresariais, usar a Lei da Inovação tornou-se um risco para todo e qualquer projeto. Melhor não usar o que promete a lei, para não se arriscar aos humores de algum fiscal iracundo.

Atolam pesquisas de importância estratégica, derrotadas na maratona surrealista de importar reagentes ou equipamentos para os laboratórios das universidades públicas. Não há correspondência entre fúria controladora e volume de recursos, pois tendem a ser quantias irrisórias. Foram abandonadas (exceto na Saúde) as políticas de compras públicas, responsáveis pelos sucessos passados da nossa indústria bélica e aeroespacial (por exemplo, a Embraer).

Os papéis engarrancham na burocracia, independentemente do talento do cientista ou da promessa do projeto. Licitações públicas escolhem propostas baratas mas frágeis, por medo das punições dos tribunais de contas. As regras do serviço público são incompatíveis com a agilidade exigida pela ciência e tecnologia. Daí a abundância de mecanismos - como as fundações - para oferecer a velocidade imprescindível. Mas, tão logo aparecem, os órgãos de controle fazem tudo para destruir esses atalhos administrativos. Na área ambiental, um parecer equivocado dá processo criminal. Ir para a cadeia por uma licença ambiental? Quem se arriscaria? Mas é o paraíso dos burocratas do "não" e dos crentes com visões simplórias.

A vida inteligente colide com órgãos de controle que permanecem na Idade das Trevas. Ou seja, temos boas políticas e as empresas estão aprendendo as artes da inovação (muito tarde, até). Mas, na hora de implementá-las, os entraves e os riscos se multiplicam. Bons quadros públicos se acovardam, com razão. As empresas não têm tempo, recursos nem competência para vencer as forças malignas da inércia. É até surpreendente que tenhamos conseguido alguns sucessos.

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